O que acontece ao crédito habitação em caso de divórcio? Quais são as implicações? O que deve fazer? Saiba isto e muito mais neste artigo!
Os dados do INE/Pordata mostram que em 2020 terão sido oficializados 17.295 divórcios em Portugal. Para muitos casais, este momento significa o fim de um capítulo importante das suas vidas e obriga à tomada de decisões difíceis com um impacto emocional e financeiro. Se é esse o seu caso saiba tudo o que precisa de fazer.
Crédito habitação e divórcio amigável: um caso real
Ana Santos começou o ano entrando num novo capítulo da sua vida. À semelhança da realidade sentida por muitos casais portugueses, o seu casamento não resistiu aos efeitos da pandemia. O desgaste da relação, reforçado pelos diversos confinamentos, associado ao facto de a designer gráfica ter objetivos de vida diferentes aos do seu marido, conduziu ao fim da relação nos últimos meses, num processo amigável e com a concordância dos dois.
Tomada a decisão, seguiu-se a fase burocrática, o anúncio aos familiares e amigos, e a negociação sobre quem fica com o quê. A maior dúvida que subsistia era: o que fazemos com a casa? Inicialmente, Ana pensou em ficar com o imóvel para si. Seria então responsável pelo pagamento do crédito habitação, embora o valor da prestação mensal fosse um pouco elevado para os seus rendimentos.
Mas uma proposta de compra da casa, por um valor irrecusável, levou o casal a optar por vender o imóvel e dividir as mais-valias resultantes da operação.
O processo de divórcio de Ana foi rápido (em menos de dois meses, a separação estava oficializada e a casa vendida) e tranquilo. Mas nem sempre é assim. Um divórcio, mesmo amigável, é sempre um momento fraturante na vida de uma família e acarreta diversas implicações.
No plano financeiro, pode mesmo potenciar o desenvolvimento de situações de sobreendividamento. Afinal, as despesas que eram partilhadas pelos rendimentos dos dois membros do casal passam a ser asseguradas de forma individualizada.
No seu caso, se está a passar por um processo de divórcio e tem um crédito habitação, há cenários que precisa considerar. Apresentamos-lhe de seguida as opções que tem.
Crédito habitação e divórcio: dois cenários mais comuns
A partilha dos bens – e em particular da casa – é um tópico sensível e suscita muitas dúvidas. A forma como a partilha é feita tem em conta diversos parâmetros. Por exemplo, se o imóvel em causa é um bem próprio – ou seja, se pertence apenas a um dos cônjuges –, é essa pessoa que fica com ele em caso de divórcio.
Mas, se a casa é um bem comum e pertence a ambos, então terá de ser partilhada. Tendo em conta que, por norma, a compra da casa é feita com o recurso a crédito habitação, pode ser resolvido de duas formas:
Cenário 1 – Vender a casa
Se ambos decidirem que não querem ficar com a casa, a opção mais habitual é vendê-la. Assim, com o dinheiro obtido, pode-se liquidar o empréstimo da casa e ficar livre deste ónus.
Dependendo do valor da venda, se houver mais-valias, estas são divididas pelos dois. Desse modo, cada um pode constituir um pé-de-meia para reiniciar uma nova fase da sua vida. No entanto, devem ambos declarar estas mais-valias no IRS: no anexo G, deverão incluir 50% das mais-valias obtidas com a venda do imóvel e – dependendo das situações – poderão ter de pagar impostos sobre os montantes recebidos.
Cenário 2 – Um dos dois fica com a casa
Outra situação muito comum nos divórcios quando existe um crédito habitação é um dos membros do casal querer ficar com a casa, assumindo a responsabilidade pelo pagamento das prestações do empréstimo bancário. Se for essa a sua vontade, é importante que tenha em conta alguns aspetos.
Em primeiro lugar, tem de informar o banco da decisão. O banco irá então verificar se apresenta condições que lhe permitam suportar a prestação da casa apenas com os seus rendimentos. Mas não se esqueça: a mudança de titularidade do crédito exige o acordo da instituição de crédito.
Caso o banco concorde com a alteração, será necessário alterar a titularidade do empréstimo, para que o outro membro do casal seja desvinculado do crédito habitação com a oficialização do divórcio, passando a não constar no contrato, nem sendo responsável pelo pagamento das prestações. Esta alteração pode ser feita através de:
- Aditamento ao contrato de crédito: procede-se a um aditamento ao contrato, assinado por todos, onde fica explícito e definido quem passa a ter a titularidade e a responsabilidade do pagamento do empréstimo.
- Celebração de um novo contrato: o banco pode também propor a celebração de um novo contrato, como condição para aprovar a desvinculação de um dos titulares do empréstimo.
Um ponto importante: a alteração da titularidade pode implicar uma revisão das condições do empréstimo. No entanto, a lei protege os consumidores, e as instituições de crédito não podem agravar os encargos com o crédito habitação (por exemplo, aumentar o spread) em caso de divórcio, de separação judicial de pessoas e bens, de dissolução da união de facto ou de falecimento de um dos cônjuges, caso o titular que se propõe ficar com o empréstimo comprovar que o agregado familiar tem rendimentos para uma taxa de esforço inferior a 55%, ou 60% (agregados familiares com dois ou mais dependentes).
Se não cumprir este requisito, o risco associado ao empréstimo será maior para a instituição de crédito, logo esta poderá colocar como condição a renegociação das condições ou até mesmo não aceitar a retirada de um dos titulares do contrato.
Tome também atenção porque, se a solução apresentada pelo banco passar pela celebração de um novo contrato de crédito – e não pelo aditamento –, a obrigação de cumprir com a cláusula de proteção deixa de existir, portanto as condições poderão também ser revistas.
Exoneração do crédito habitação: o que são as tornas?
Outra dimensão a considerar se avançar para divórcio e tiver um crédito habitação partilhado é o apuramento das chamadas tornas. Esta expressão refere-se à compensação que o membro do casal que fica com a casa (e com a titularidade do empréstimo bancário) tem de pagar ao outro.
O valor desta compensação é definido livremente por ambas as partes, mas muitas vezes existem dúvidas sobre o método mais indicado para o calcular. Uma forma possível de apurar um montante justo para esta compensação será pela diferença entre o ativo e o passivo, ou seja, a diferença entre o valor do imóvel e o valor do crédito habitação em dívida sobre esse imóvel.