Se é comprador ou vendedor de um imóvel é importante saber o que é o direito de preferência, em que situações se aplica e como deve proceder antes de vender ou comprar um imóvel. Explicamos-lhe tudo neste artigo.
O direito de preferência na compra ou venda de um imóvel está previsto na lei e obriga quem vende a dar preferência a pessoas ou entidades públicas em determinadas circunstâncias.
Por exemplo, quem mora em casa arrendada há mais de dois anos, tem direito de preferência na compra, caso o senhorio queira vender o imóvel.
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Do mesmo modo, há entidades públicas que podem exercer o direito de preferência sobre determinados imóveis, por exemplo, no caso de imóveis localizados em zonas classificadas (ou em vias de classificação) pela Direção-Geral do Património Cultural, no caso de imóveis localizados em áreas protegidas e no caso de imóveis localizados em áreas de reabilitação urbana ou pressão urbanística.
Mas vejamos então o direito de preferência em detalhe.
O que é o direito de preferência?
O direito de preferência está previsto no Código Civil, no qual se define o pacto de preferência como a “convenção pela qual alguém assume a obrigação de dar preferência a outrem na venda de determinada coisa”.
Como tal, a compra e venda de um imóvel pode estar sujeita ao direito de preferência por vontade das duas partes. Neste caso, uma das partes assume a obrigação e a outra (titular do direito de preferência) tem a liberdade de exercer, ou não, o direito que lhe foi conferido.
Além do vínculo que resulta da vontade das duas partes, existem também situações em que a lei impõe o direito de preferência. Quando é assim, falamos de direitos legais de preferência.
Direito legal de preferência
Está previsto no Código Civil, constituindo o direito que certa pessoa tem de preferir qualquer outra pessoa na compra, ou noutro negócio, previsto na lei.
O Código Civil nomeia vários casos em que se aplica o direito legal de preferência. Por isso, tratando-se do processo de compra e venda de um imóvel, é importante verificar se está enquadrado num dos seguintes casos:
- O direito de preferência do arrendatário, se o senhorio quiser alienar o local arrendado a terceiros e o arrendamento for superior a dois anos, mesmo que esteja em causa um imóvel não sujeito ao regime de propriedade horizontal (artigo 1091.º);
- O direito de preferência no caso de prédios rústicos, em que os proprietários de terrenos confinantes, que tenham uma área inferior à chamada unidade de cultura, têm o direito de preferência no caso de venda relativamente a quem não seja proprietário confinante, a não ser que um dos terrenos seja parte componente de um prédio urbano ou se destine a fim que não seja a cultura (artigos 1380.º e 1381.º);
- O regime de compropriedade, sendo que o comproprietário goza do direito de preferência no caso de venda a terceiros da quota de qualquer um dos seus consortes (artigo 1409.º);
- O proprietário do solo sobre o qual incide um direito de superfície tem direito de preferência na venda do direito de superfície (artigo 1535.º);
- O direito de preferência na alienação de prédio encravado a favor do proprietário de um prédio com a obrigatoriedade legal de passagem no caso de venda, do prédio dominante (artigo 1555.º).
Direito de preferência de entidades públicas
No que toca a bens imóveis, a legislação dita ainda que algumas entidades públicas podem exercer o direito de preferência em determinadas circunstâncias. São estas:
- Estado;
- Regiões autónomas;
- Municípios (Câmaras Municipais);
- Direção-Geral do Património Cultural
Estes casos estão, desde logo, previstos na Lei de Bases da Habitação. E, aí, fica claro que estas entidades públicas são titulares e têm a faculdade de exercer o direito de preferência nas transmissões onerosas de prédios entre particulares, quando se tratar de dar seguimento aos objetivos da política pública de habitação.
Mais concretamente, este direito existe para dar cumprimento a intervenções ou à implementação de políticas públicas destas entidades. Necessidade que existe, por exemplo, nestas circunstâncias:
- Reorganização da utilização do solo (quando está em causa o cumprimento dos planos de pormenor no ordenamento do território);
- Proteção do património (nos casos de imóveis classificados ou em vias de classificação);
- Áreas definidas para reabilitação urbana (as designadas ARU).
Desta forma, segundo explica o Portal do Ministério da Justiça, estas entidades públicas têm prioridade na compra e venda de determinados imóveis, “mantendo o mesmo valor e as mesmas condições acordadas com outro comprador”.
E que imóveis podem ser alvo do direito legal de preferência por parte destas entidades públicas? A Lei de Bases da Habitação, bem como os diplomas que a regulamentam, especificam os vários tipos de imóveis abrangidos pelo direito de preferência.
Imóveis classificados ou em vias de classificação
Pelo seu interesse cultural, alguns edifícios podem ser classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal. Assim, tanto os imóveis classificados, como em vias de classificação têm de seguir regras específicas não só quanto a projetos e obras, mas também em processos de venda.
Pode ser de interesse público comprar estes imóveis e, assim, as entidades referidas têm a faculdade de exercer o direito legal de preferência.
Imóveis localizados numa área protegida
Quando falamos em áreas protegidas, podem estar incluídas reservas naturais, parques naturais ou até zonas de paisagem protegida. Esta classificação visa conferir-lhes um estatuto legal que permita salvaguardar a biodiversidade, os ecossistemas, o património geológico e até a paisagem. Como tal, os imóveis localizados nestas zonas podem estar sujeitos ao direito de preferência.
Imóveis localizados em áreas de reabilitação urbana
Os municípios definem também locais em que é necessário realizar obras estruturais de reabilitação: áreas de reabilitação urbana. Estas precisam de uma intervenção específica devido à insuficiência ou degradação dos edifícios, das infraestruturas ou mesmo dos equipamentos ou espaços de uso coletivo. Por este motivo, os imóveis nestas áreas estão abrangidos pelo direito de preferência.
Imóveis localizados em zonas de pressão urbanística e identificados no Programa Nacional de Habitação
Esta foi uma imposição ditada pelo Decreto-Lei n.º 89/2021, de 3 de novembro, que especifica que o direito de preferência é exercido quando há falta ou desadequação de oferta em zonas de pressão urbanística ou em territórios identificados no Programa Nacional de Habitação.
Se mora em Lisboa, Cascais, Setúbal ou Mafra, fique a saber que estes municípios já definiram zonas de pressão urbanística.
Nestes casos, a prioridade é dada aos municípios, seguindo-se as regiões autónomas e, por fim, o Estado (representado aqui pelo Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, I. P.). Para tal, têm o prazo de 10 dias para, querendo, exercer o direito de preferência.
Em qualquer das situações, importa ressalvar que o direito destas entidades não se sobrepõe ao direito dos arrendatários, nem ao das cooperativas de habitação e construção.
Qual a consequência de não observar a obrigação de dar preferência?
A comunicação da intenção de venda constitui uma obrigação do vendedor, sendo que a efetivação da transmissão com a violação da obrigação de dar preferência confere ao titular do direito de preferência a possibilidade de reverter a situação através do mecanismo judicial de uma ação de preferência, com vista a dar sem efeito a compra e venda realizada anteriormente e a adquirir o imóvel em causa.
Como proceder num processo de direito de preferência de uma entidade pública sobre um imóvel?
Se o seu imóvel está enquadrado numa das situações em que haja entidades públicas com direito legal de preferência, saiba que tem a obrigatoriedade de publicar um anúncio. Nesse sentido, há um conjunto de passos a seguir.
Passo 1: Saber se o imóvel está em situação de preferência
Procure perceber se o seu caso se enquadra no âmbito do direito de preferência de uma entidade pública. Comece por aceder à página da câmara municipal da localização do imóvel. Consulte também a página da Direção-Geral do Património Cultural, onde pode pesquisar o património classificado ou em vias de classificação.
Passo 2: Colocar um anúncio
Enquadrando-se numa das condições impostas pela lei no âmbito do direito de preferência e tendo chegado a acordo para a compra e venda do imóvel, está então obrigado a colocar um anúncio.
Note que, para sua segurança, pode colocar o anúncio para o exercício do direito legal de preferência sem realizar o passo 1.
Este anúncio pode ser colocado tanto pelo vendedor — seja este um cidadão ou uma empresa — como por uma entidade que o represente no processo. Por exemplo, uma agência imobiliária.
Para isso, basta aceder à página do Casa Pronta. Através deste site, pode criar um anúncio, preenchendo o formulário, no qual deve constar vários elementos que identificam:
- Quem faz o pedido;
- O vendedor ou vendedores;
- O comprador ou compradores;
- O imóvel, referindo a localização, bem como o número da descrição na conservatória do registo predial, o artigo matricial e a área;
- O valor de compra e venda;
- A data previsível do negócio.
Tome nota de que este processo tem o custo de 15 euros.
Passo 3: Acompanhar o processo
A partir do momento em que coloca o anúncio, e após a realização do respetivo pagamento, as entidades públicas com direito legal de preferência têm 10 dias úteis para se pronunciar sobre a intenção de exercer, ou não, o seu direito de preferência sobre o imóvel.
O processo pode ser acompanhado através do site Casa Pronta, onde pode verificar o estado do pedido. Se não houver nenhuma resposta ao anúncio no prazo de 10 dias úteis, pode seguir com a venda do imóvel.